Acredito firmemente ser a vida uma sucessão de
mortes pequenas, diárias.
A sua morte no dia que nos conhecemos, naquele bloquinho de carnaval em agosto.
A minha morte, ecoando palavras de vento por língua de terra.
A nossa morte no momento que dissemos sim, olhos fechados.
Pereceram as projeções, reflexos de espelhos enferrujados.
Estão já a sete palmos carinhos e juras. Jazem em algum lugar infrutífero os
sentimentos abortados em gestos miúdos, em versos mesquinhos. Morreu até a semente que poderia germinar transmutada.
Deixo hoje a tua lápide enfeitada com um girassol. Para te convidar a ver
que cada distorção pode também ter um recomeço no fim. Cada pedaço da nuvem que
nos cobre os olhos, segundos, terceiro, podem desanuviar.
Te agradeço pelos punhais diários, te agradeço pela foice derradeira. Te
liberto em carta e peço que morra, já sem tempo, esse sentimento putrefato.
Você em mim está podre. Há espaço, talvez, para uma
função que você como eu conheci jamais poderia ter. Há espaço pra que sejas adubo.
Que todas as mortes que morremos juntos irriguem
a terra e jorrem novas pequenas vida.
Um dia, pisando no cemitério de verdades e crenças que sou eu mesmo, talvez nem
lembre quantos insumos sustentarão os meus pés. Terei, então, essa lápide
que te dou enfeitada, a me lembrar do valor das pequenas mortes que nós somos.
Desde o dia em que nos atiramos do abismo. Obrigado, por, finalmente, estar
morto em mim. Eu não te liberto - te reverencio, transformo. Te deixo na
esquina. Oferenda feita, ebó despachado.
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